A extinção da CFSBF (1910 - 1916)
No que se refere à CFSBF, Venceslau Brás¹ emprega tom bastante diverso daquele apresentado por Hermes da Fonseca. O presidente anuncia de forma implícita o fim da CFSBF, ao declarar que a quantia aprovada para a execução dos trabalhos já havia sido em sua maior parte paga ao executante, e sobretudo ao afirmar a necessidade de se buscarem novos caminhos para a conservação das obras realizadas, dispensando de tal ônus o governo federal.
O relatório do MVOP de 1916² teve por conteúdos básicos a informação da extinção da CFSBF e a destinação dos materiais desta Comissão para a Inspetoria Federal dos Portos, Rios e Canais.
Por que motivo, mesmo sem a conclusão das obras e a definição da ocupação dos terrenos, resolve o governo dar por extinto um trabalho que custou aos cofres públicos³ a quantia total de 16.971.387$226, no mínimo cinco anos de trabalhos de campo, e diversas obras realizadas, a contar do início do ano de 1911.
A Primeira Guerra e o fato da empreiteira ser alemã surgem na literatura como possíveis fatores da extinção da CFSBF. Outro caminho, apenas indicado aqui, parece-nos mais promissor: o entendimento dos fatores que levaram à regionalização da questão do saneamento da Baixada Fluminense.
No relatório sobre os trabalhos desenvolvidos no ano de 1915, elaborado por Moraes Rego e encaminhado ao Sr Ministro do MVOP, Dr. Augusto Tavares de Lyra, encontramos um parecer*¹ , datado de 7 de junho de 1916*² que indica claramente que o saneamento da Baixada Fluminense, alçado a questão nacional nos anos precedentes*³, passou a ser regionalizado, uma vez que favorecia apenas ao Estado do Rio de Janeiro. Entendemos, portanto, que é neste movimento de regionalização que poderemos encontrar indícios das razões da extinção da CFSBF.
¹ O presidente afirma:
(...) os orçamentos approvados para os trabalhos já concluídos e acceitos importam em 7.679:821$186 e a despesa realmente effectuada e paga na quantia de 6.615:081$062.
A conservação das obras que vão sendo executadas é cada dia mais onerosa aos cofres públicos e o seu abandono, ou conservação deficiente, terá como conseqüência a perda total de não pequena somma já despendida. É, pois, indispensável cogitar dos meios de aproveitar os resultados de tão importante emprehendimento, uma vez que a desapropriação dos terrenos beneficiados não se tornou effectiva, conforme a principio parecera conveniente. Fonte : BRASIL. Mensagem (1915). Mensagem apresentada ao Congresso Nacional: na abertura da Primeira Sessão da Nona Legislatura pelo Presidente da República Venceslau Brás, 1915
² Tendo a lei da despeza para o anno de 1916 consignada para a fiscalização dos trabalhos de saneamento da Baixada Fluminense, apenas a precisa verba para os seis primeiros mezes do anno, foi esse serviço suspenso a 3 de junho, ficando a extinta Comissão fiscal, sendo transferido todo acervo a ella pertencente, constando de material de escriptorio e dragagem, para a Inspectoria Federal dos Portos, Rios e canaes.
Com relação aos melhoramentos realizados no decurso do segundo semestre, grande parte delles teve de ser medida pela Inspectoria de Portos que para isso designou um dos seus engenheiros e diversos auxiliares, os quaes, durante os quatro mezes seguintes, procederam ao arrolamento do material de escriptorio e de dragagem pertencente à extincta commissão.
As medições feitas comprehenderam os serviços de dragagem, de destocamentos, roçadas e cães de faxinas nas bacias de diversos rios, notadamente nas do Macacú, Guaxindiba, Iguassú e canal de Magé Velho.
A somma correspondente a estas medições attingiu à cerca de 20 mil libras esterlinas.
O material de dragagem arrolado comprehende duas excelentes dragas, uma de alcatruzes, outra de sucção, servidas por quatro batelões de aço, e de um grande numero de lanchas, rebocadores, chatas e pequenas embarcações indispensáveis a esse gênero de trabalho. Este material fluctuante ficou depositado na ilha de Paquetá onde tinha a Comissão um posto de serviço.
O material de escriptório foi guardado nos depósitos da Fiscalização do Porto do Rio de Janeiro.
A situação dos serviços da Baixada Fluminense não teve modificação alguma de 1 de julho até 31 de dezembro findo. Ao ser ordenada a suspensão de todos os trabalhos, e a extinção da respectiva Commissão fiscal, os empreiteiros – Gebrueder Goedahart A. G – apresentaram ao Governo um protesto, no qual afastando de si a responsabilidade da não conclusão do contracto, no devido prazo, reclamaram contra a cessação dos mesmos allegando que tal lhes ocasionava grandes prejuízos.
Os actos referentes ao assumpto foram, em mensagem de S. Ex. Sr. Presidente, subbmettidos á apreciação do Congresso Nacional. (grifos meus). Fonte : Relatório do MVOP, 1916.
³ Com relação ao total gasto pela CFSBF, obtivemos diferentes dados. O valor de 16. 971; 3874 226 foi apresentado por Tobias Moscoso., p.189. (Relatório) O engenheiro Hildebrando de Góes apresenta em seu relatório da Comissão um valor bem próximo ao anterior: 16.956: 300$110. Fonte: Ministério de Viação e Obras Públicas, 1919.
*¹ Com os serviços de saneamento da Baixada Fluminense, já despendeu o governo da União a importante somma de 10.834:205$310 (... ).
Com os trabalhos que estão em andamento e constantes do mesmo anexo, terá de ser despendida a de 3.255:140$624, caso sejam todos elles concluídos no dia 3 de junho corrente, pois a 1 de julho seguinte termina o prazo do contracto de empreitada.
É certo, porém, que tal não se dará, assim como é certo que, attendendo ás preemente condições do paiz não será possível á União continuar a manter um serviço como o saneamento da Baixada Fluminense, favorável, quase na sua totalidade ao Estado do Rio de Janeiro.1 (grifo nosso). Fonte: MINISTÉRIO DE VIAÇÃO E OBRAS PÚBLICAS, Directoria Geral de Obras Públicas 1ª sessão, Autuação nº 553-16,1916.,p.4.
*² Relatório encaminhado por Moraes Rego, em 7 de abril de 1916. Apreciado pela Diretoria de Obras Públicas do MVOP, em 7 de junho de 1916, exatamente dois meses após ter sido entregue.
*³ A questão do saneamento da Baixada Fluminense esteve presente em mensagens ao Congresso Nacional dos presidentes: Nilo Peçanha (1910), Hermes da Fonseca (1913) e Venceslau Brás (1916). Segundo os dois primeiros, a CFSBF era responsabilidade do governo federal, cabendo a este, portanto, prestar contas sobre o andamento dos trabalhos.